Portugal vai ter a possibilidade de determinar as zonas do país em que os viticultores poderão aderir ao programa comunitário de arranque voluntário de vinha, de modo a impedir que as regiões com uma produção de maior qualidade sejam abandonadas.
Esta era a grande reivindicação apresentada pelo ministro da agricultura, Jaime Silva, durante as discussões travadas ao longo de um ano entre os países da União Europeia (UE) sobre as primeiras ideias da Comisão Europeia para a reforma do regime comunitário de apoio ao vinho.
Em resultado destas discussões, Bruxelas formalizou ontem as suas propostas legislativas, que a presidência portuguesa da UE vai tentar fazer aprovar pelos seus pares até ao fim do ano.
As propostas mantém como trave mestra da reforma o programa de arranque voluntário de vinha para reequilibrar o mercado e acabar com os excedentes de produção que absorvem anualmente cerca de 500 milhões de euros em ajudas à destilação para aguardente ou bio-etanol.
Mas, respondendo às preocupações dos Estados membros o objectivo inicial de 400 mil hectares de vinha a arrancar (numa superfície total de 3,4 milhões de hectares na UE), foi agora reduzido para 200 mil hectares.
Em contrapartida, o montante das ajudas europeias que, ao longo de cinco anos, vão incentivar o arranque, revelou-se mais generoso do que o previsto: 7.174 euros por hectare no primeiro ano de vigência do programa, valor que será progressivamente reduzido para 2.938 euros no quinto e último ano.
Bruxelas, que previra inicialmente deixar a decisão do arranque unicamente a cargo de cada produtor, aceitou, nomeadamente por pressão de Portugal, dar aos Estados a última palavra: cada governo terá o direito de limitar o arranque da vinha a um máximo de 10 por cento da superfície vitivinícola total nacional. Ao mesmo tempo, refere a Comissão, "para evitar dificuldades de ordem social ou ambiental, será permitido aos estados membros limitar o arranque de vinha situada em zonas de montanha ou de forte declive, bem como nas regiões ecologicamente sensíveis".
Esta medida destina-se a impedir que os produtores das regiões demarcada e competitivas, ou que recebem ajudas à reconversão, se sintam financeiramente incentivados a abandonar a produção. Isto porque o programa do arranque dirige-se sobretudo aos produtores pouco competitivos que não conseguem escoar a produção e absorvem as ajudas à destilação, que, com a reforma, serão suprimidas.
"As propostas mostram que temos tido uma atitude de escuta", afirmou Mariann Fischer-Boel, comissária europeia responsável pela agricultura.
Forte concorrência
Além de ter suavizado as propostas, Bruxelas aumentou o envelope financeiro global que vai conceder anualmente aos dezassete Estados produtores para apoiar os programas de reconversão. Este envelope será de 623 milhões de euros em 2009 (o primeiro ano de aplicação da reforma), passando para 830 milhões a partir de 2015. A estes montantes serão acescentados 100 milhões de euros anuais a partir de 2009 que passam para 400 milhões a partir de 2014 para medidas de desenvolvimento rural. Embora os cálculos ainda não estejam finalizados, Portugal poderá esperar receber, destes dois programas, pelo menos 40 milhões de euros anuais, a partir de critérios de repartição ligados à area de vinha e à produção, entre outros.
"A reforma não é drama nenhum para Portugal desde, no entanto, que as adegas cooperativas percebam que têm de se modernizar", afirmou o ministro da agricultura ao PÚBLICO. As adegas, que representam 50 por cento da produção nacional têm situações muito díspares, explicou, sublinhando a modernidade e internacionalização de algumas e as dificuldades financeiras de outras. "Com a reforma, as adegas poderão receber ajudas à modernização desde que apresentem projectos de mercado — mas não de saneamento finaneiro — que incluam, por exemplo, a integração da fileira, a reestruturação das vinhas dos seus associados, a modernização do equipamento ou a sua internacionalização", frisou.
Apesar da oposição de muitos produtores da UE, Bruxelas considera que a reforma é "crucial" parea assegurar a competitividade do sector. O problema está em que os vinhos europeus, apesar de terem conseguido até agora manter-se no topo mundial em termos de produção — 60 por cento do total — consumo, exportações e importações, estão a sofrer os efeitos tanto de uma quebra do consumo como de um forte aumento da concorrência dos produtores dos países do 'novo Mundo', sobretudo Austrália, Argentina, Chile e Estados Unidos (Califórnia), cuja parte de mercado decuplicou desde os anos oitenta para atingir hoje 21,4 por cento do total. |