Monção e Melgaço, Alvarinho e o caminho da diferenciação
Fugas | 07-04-2015

Aquela que é a mais famosa das nove sub-regiões do Vinho Verde, a sub-região de Monção e Melgaço, também conhecida com a sub-região do Alvarinho, vive um período de indefinição e agitação.

A sub-região encontra-se numa encruzilhada que irá moldar o futuro económico dos viticultores e produtores de vinho de Monção e Melgaço, moldando o futuro e as esperanças daquele que já foi considerado como o ouro verde do extremo norte de Portugal continental.
 
Durante anos, a sub-região viveu do conforto e da segurança de conseguir manter a exclusividade sobre a utilização da casta Alvarinho, a variedade branca mais reconhecida e valorizada em todo o Portugal. Há que recapitular o mérito desta sub-região e dos seus agentes económicos, que resgataram esta variedade do descuido, uma casta que à época era pouco valorizada e que ganhou prestígio e valor graças ao esforço conjunto dos produtores destes dois concelhos minhotos. Hoje não existem dúvidas sobre a validade e superioridade da variedade Alvarinho, muito provavelmente a melhor das castas brancas nacionais e, certamente, uma das melhores castas brancas internacionais.
 
O nome Alvarinho ganhou tamanha notoriedade junto dos consumidores nacionais que, mesmo num passado recente, numa época em que pouco ou nada se sabia sobre as castas portuguesas, quando poucos conseguiam identificar as castas de cada região, o Alvarinho já era chamado pelo nome. Num país que sempre privilegiou os vinhos de lote, o Alvarinho cedo se habitou a reinar sozinho na garrafa. O Alvarinho sempre se afirmou como excepção, condição que se transformou ao mesmo tempo na maior benesse e no maior drama de Monção e Melgaço.
 
Um drama porque a sub-região e os seus produtores habituaram-se a depender do nome de uma variedade sem se preocuparem em promover e referir o nome da sub-região, sem identificar e enaltecer os méritos das condições ímpares que os dois concelhos têm para maximizar o potencial da casta Alvarinho. Ao promover simplesmente uma casta, permitiram que muitos outros se apropriassem do seu nome, e da fama entretanto granjeada, conduzindo à sua propagação pela generalidade do território nacional.
 
Não é difícil afirmar que os melhores vinhos Alvarinho continuam a nascer na sub-região de Monção e Melgaço. Parece-me claro que a sub-região reúne uma série de condicionantes naturais que garantem qualidades singulares à casta, garantindo vinhos que não conseguem ser replicados em nenhuma outra parte do território. Porém, se o prestígio do nome Alvarinho foi construído à custa da qualidade ímpar dos Alvarinho de Monção e Melgaço, a verdade é que a sub-região pode agora sair prejudicada pelo risco de banalização do nome Alvarinho e pela entrada fulgurante de vinhos Alvarinho vendidos a preços de saldo.
 
Como poderá a sub-região responder a estes desafios é a grande questão do momento para o tecido económico de Monção e Melgaço. Pretender continuar a impedir a utilização do nome Alvarinho fora da sub-região é insustentável por força das regras europeias. Restringir o uso de uma casta a uma região ou sub-região está fora do alcance de qualquer país ou região. Se os produtores locais tivessem começado por insistir no nome da sub-região, Monção e Melgaço, em lugar do nome da casta, os problemas actuais não existiriam. Mas a verdade é que não o fizeram e agora há que olhar para o futuro e analisar as muitas alternativas que se colocam. A primeira, claro, é permanecer tudo na mesma, esperando que por algum milagre divino a cotação dos vinhos da sub-região e a cotação da variedade Alvarinho se mantenham imutáveis.
 
Mas existem outras alternativas que poderão ajudar a definir os anos vindouros. Uma dessas alternativas, talvez a de mais difícil concretização, seria aproveitar o processo legislativo italiano para tentar criar uma denominação equivalente ao DOCG italiano, uma classificação que indicasse a sub-região de Monção e Melgaço como indicação Vinho Verde Superior ou outro palavreado de consequências semelhantes. Não será fácil pelas diferentes interpretações da lei, pelas alterações legislativas que seriam indispensáveis e pela natural rejeição das restantes oito sub-regiões do Vinho Verde, que dificilmente aceitariam este carácter de excepção e e este designativo “superior”.
 
Outra alternativa seria seguir a lógica de Mosel, na Alemanha, uma das regiões de vinhos brancos de maior prestígio no mundo, que decidiu permitir aos produtores da sub-região de Saar inserir o nome da região em letras bem gordas no rótulo de cada um dos vinhos oriundos desse vale. A identificação da sub-região fica assim suficientemente nítida para a converter num sinónimo de distinção com origem bem definida.
 
A terceira alternativa, talvez a mais fácil de implementar, seria seguir o exemplo neozelandês de um grupo de produtores de Hawkes Bay. Ao constatarem que numa parcela da denominação Hawkes Bay os solos eram tão diferentes que o carácter dos vinhos se ressentia dessa particularidade, e reflectia um estilo diferenciado, os produtores com vinhas nesse pequeno fragmento da região decidiram criar uma associação e marca que os diferenciasse dos demais produtores da região. Sem recorrer a mudanças administrativas e legislativas sempre morosas e complicadas, a associação de produtores criou um autocolante que identifica a diferença e que cedo granjeou respeito e se transformou num sinónimo de qualidade.
 
Quem sabe se esta solução não seria a mais fácil l de implementar. Seria pelo menos muito mais fácil que uma quarta e mais explosiva possibilidade, a emancipação da região do Vinho Verde para criar uma estrutura autónoma que transformasse a sub-região numa região de pleno direito. Uma aposta arriscada, sobretudo tendo em conta a pequena dimensão da putativa nova região, para não mencionar a contenda indelével a que por vezes os dois concelhos se dedicam num desperdício de energias perfeitamente estéril.
 
De uma forma ou de outra, com mudanças ou sem mudanças, a sub-região deveria esforçar-se na promoção do nome Monção e Melgaço, mostrando a Portugal e ao mundo que é capaz de produzir alguns dos grandes vinhos brancos do mundo.
 
 
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