O aniversário da «mãe» do vinho do Porto
O Primeiro de Janeiro | 07-02-2006

Em 1756 – há 250 anos – nasceu em terras do Douro a mãe do que viria a ser o Vinho do Porto. O pai foi Sebastião José de Carvalho e Melo – Primeiro-Ministro do rei D. José I – mais tarde conde de Oeiras e depois Marquês de Pombal, título pelo qual é mais conhecido.

Pois foi este ilustre monárquico o autor da Região Demarcada do Douro – a primeira e portanto a mais antiga de todas as regiões demarcadas em qualquer parte do Mundo. E de seguida criou a Real Companhia Velha das Vinhas do Alto Douro, empresa que durante alguns anos manteve o monopólio da comercialização do que passou a designar-se de Vinho Generoso do Douro ou Vinho do Porto.
A Inglaterra foi dos primeiros, senão mesmo o primeiro, consumidores estrangeiros deste especialíssimo tipo de vinho.
Por cá, também se iniciou, formalmente, a sua divulgação, apesar de muito antes se consumir o Vinho Generoso que se obtinha das uvas amadurecidas nas terras xistosas da região duriense.
É deveras importante e curiosa a história das origens do Vinho do Porto e, naturalmente, não cabe aqui explaná-la, nem resumidamente, porque me falta o “engenho e arte” e o conhecimento integral, através dos tempos, para me atrever a tal tarefa. Aliás, a história existe e não será difícil encontrá-la nas diversas publicações que o mercado livreiro possui e, ainda, nas instituições ligadas a este sector, como o Instituto do Vinho do Douro e Porto, com sede nesta cidade..
Comecei por referir o nascimento da mãe do Vinho do Porto porque foi a partir da criação da já citada Região Demarcada, que ele se baptizou e passou a ser conhecido. Sendo produzido nos alcantilados terrenos durienses, parece que a sua denominação deveria ser Vinho do Douro. Mas, apesar da nascença se situar a cerca de 100 quilómetros do Porto, foi nesta cidade que ele foi baptizado e dado a conhecer ao mundo, dado que a sua saída dos armazéns de Vila Nova de Gaia, onde atingia a maioridade e onde era (e ainda é) engalanado para apresentação pública, quer nacional quer internacional, se situava e situa no distrito do Porto e foi pela barra do rio Douro que ele demandou pela primeira vez , “outras terras” para conhecimento de “outras gentes”.
É, portanto, de toda a justiça – diria mesmo obrigação – comemorar com toda a dignidade – acrescente-se “com pompa e circunstância” – os 250 anos da criação da primeira Região Demarcada do Mundo.
Os “nossos senhores do mando” parece não ligarem muito a esta riqueza que possuímos e que se traduz num valor de milhões de euros que anualmente coroam as transacções de Vinho do Porto e que representam, para o próprio Estado, uma mais valia notável que não é substituível por qualquer outro produto nacional.
Eu digo que parece não ligarem a esta riqueza portuguesa porque a luta travada para inibir outros países da utilização de termos somente atribuídos a Vinho do Porto e que com ele se identificam, como “tawny”, “ruby” e sobretudo “vintage” se apresentou débil e sem consistência. O valor em causa com esta dispersão obrigava a um tal veemente protesto e a uma tão dura luta como se em causa estivesse a perda de um membro de um corpo uno e indivisível, legitimamente português, dado que os símbolos que se deixaram vulgarizar são apanágio de características únicas de um produto nacional que não tem paralelo e que é tão genuíno como genuína é a nacionalidade portuguesa.
O barulho e os nossos protestos na União Europeia deveriam ter sido de tal modo, que os ânimos favoráveis a esta roubalheira se teriam assustado o suficiente para nos deixarem em paz.
Quando o espanhol Conde de Castelo Melhor ameaçou o Marquês de Pombal de invadir Portugal com um exército poderoso de muitos milhares de soldados, em tal número que abafaria o exército português, o estadista nacional, imperturbável e ciente de uma força que a razão triplicaria, respondeu: saiba V.Exª. que um homem em sua casa pode tanto que, mesmo depois de morto, são precisos quatro homens para o tirarem dela”. E o exército espanhol não nos invadiu !

Um voluntarismo deste quilate perderam aqueles que se deixaram comer pelas alegações antagonistas. Porque a Califórnia é americana e a África do Sul é também muito forte e a Austrália, que vem a seguir, também é grande e por isso baixamos os braços, atentos, veneradores e obrigados. Qualquer dia clamam que também querem usar a designação de Vinho do Porto, dado que todos estes países possuem um “porto” de mar ou de rio e a designação bastarda de “Port” não é nova pois há mais de uma dezena de anos, num restaurante em Madrid, o empregado de mesa quis impingir-me o que ele chamava Viño de Oporto e que mais não era que um Bandera’s Port. Bandera era o falsificador espanhol do Vinho do Porto e hoje possuidor de uma legítima empresa do ramo, adquirida há já algum tempo.
Aos nossos representantes, nos areópagos internacionais, falta vontade e conhecimento para advogar e se oporem a estes saques aos nossos bens. E, sobretudo, são fracos. Falta-lhes a matéria-prima com que se faz o “ketchup”.
Daqui por uns anos Vinho do Porto, Vintage, Ruby, Tawny, serão termos utilizados em qualquer zurrapa vinhateira que qualquer país produza e que, naturalmente, até vêm vender no nosso território, porque o nacionalismo do comércio, está nas caixas registadoras e pouco lhes importa que uma bastardia protegida destrua uma valia única que se deveria defender como cada um defende o seu nome próprio.
Até parece que parte da virilidade portuguesa anda muito por baixo e a dignidade e orgulho, com todos os seus atributos, vai decaindo e por isso o amorfismo vai proliferando e nas assembleias internacionais já não temos voz grossa para dizer: Basta, quando querem apoderar-se de caracteres portuguesíssimos e inalienáveis que fazem parte integrante da Nação.
 
 
 
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