Além de produzir um dos vinhos generosos mais antigos do País, a José Maria da Fonseca tem mais de 30 marcas próprias.
O caminho tem sido longo para levar o moscatel de Setúbal até às mesas portuguesas. Mas a aposta tem ganho terreno, embora os estudos de mercado não deixem dúvidas sobre o desconhecimento que os portugueses ainda têm deste néctar "nascido e criado" sob a influência do microclima da serra da Arrábida. A promoção vem dando frutos, ainda que quase a conta-gotas, enquanto os prémios internacionais ajudam a catapultar este "vinho generoso" para um patamar mais acima. Já é a bandeira (ou será coqueluche?) da histórica casa em Azeitão José Maria da Fonseca (JMF). Mesmo representando apenas 10% da comercialização da empresa familiar.
Chegou o momento de a própria produção dar ideias aos consumidores. A proposta parte do presidente do conselho de administração da JMF, António Soares Franco: "Nesta época do ano, estar sentado à lareira a comer castanhas assadas, acompanhadas com um moscatel, é uma excelente combinação", sugere, embora prefira alertar para a importância de os chefs de cozinha começarem a estudar "finais de refeição" em que o moscatel assente que nem uma luva.
"As bebidas espirituosas estão em queda livre, o que abre boas possibilidades a um cálice de moscatel", acredita António Soares Franco, admitindo que quando a maioria dos portugueses conhecer este vinho licoroso - que hoje tem saída apenas na zona da Grande Lisboa - "talvez o venham pedir à sobremesa".
Afinal, garante, está em causa "um produto que tem uma boa imagem e que está muito acessível na qualidade/preço", embora alerte a concorrência para o facto de que nunca deverá colocar uma garrafa no mercado abaixo dos quatros euros. Precisamente com o intuito de a imagem não ser beliscada. "Temos de ganhar estatuto e arranjar forma de comunicar com os restaurantes", nota.
As vendas anuais da JMF rondam os 500 mil litros de moscatel, um dos mais antigos vinhos generosos de Portugal, a par dos vinhos do Porto e da Madeira, que lhe valeu a demarcação de origem há mais de um século, embora a sua história remonte aos tempos de Luís XIV. Já então se consumia moscatel de Setúbal no estrangeiro, para onde hoje são exportados apenas cerca de 10% da produção, a repartir por 20 países.
Os nórdicos, os norte-americanos e os brasileiros são os principais clientes. Haveria mais interessados, mas a produção está praticamente toda vendida em Portugal, tratando-se de um vinho que precisa de envelhecimento, não podendo ir para o mercado antes dos quatro ou cinco anos de estágio.
Mas é caso para dizer que na JMF há mais vida para além do moscatel. Há todo um "império vinícola", traduzido na produção de mais de 30 marcas de vinho, que foi sendo conquistado a pulso desde o longínquo 1834, quando José Maria da Fonseca, filho de um comerciante no Cais do Sodré, avançou para este negócio, que se prolongou por gerações e que hoje chega a exportar cerca de 80% da produção.
A família viria a passar um mau bocado no período pós-25 de Abril, acabando por ter de vender 51% da empresa a um sócio americano, em 1985. O juro estava a 35% e era pago à cabeça. Matava qualquer tentativa de negócio. Mas havia de recuperar a "casa-mãe", depois de pagar dívidas, comprar adegas e reequipá-las. Deu um salto decisivo no mercado e em 1996 já estava de malas e bagagens na JMF.
Ainda hoje António Soares Franco recorda o regresso a casa com orgulho. Para este engenheiro formado no Instituto Superior de Economia, onde fez o último exame na noite de 27 de Novembro de 1974, em pleno recolher obrigatório, mesmo em tempo de crise "não há tempo para parar". |