Vindimas. O vinho do vizinho será melhor que o meu?
ionline | 23-09-2010

O que fazem um empresário ribatejano, uma modelo brasileira, um investidor inglês e meia dúzia de crianças loiras a suar em bica sob o sol quente do Alentejo? Vindimam. O cenário parece pouco provável, mas as probabilidades aumentam quando se explica o entorno.

Estamos nas primeiras vindimas do L''AND Vineyards, um resort pouco convencional, projectado pelo grupo Sousa Cunhal na região de Montemor-o-Novo. Longe da praia e da agitação balnear, o projecto joga com outro trunfo da imagem internacional do país, o vinho. E inaugura uma modalidade: com a compra de uma luxuosa moradia vem um pedaço de vinha cuja produção está a cargo do proprietário. Ou seja, cada um terá direito ao seu vinho personalizado no sabor, na textura e com rótulo incluído, sob a orientação de um dos mais conceituados enólogos portugueses, Paulo Laureano.

É este quem comanda as hostes das primeiras vindimas do resort, feitas por um grupo de 200 convidados. "O L''AND Vineyards é mais um desafio na minha carreira como enólogo", diz. De luvas grossas e tesoura na mão, o que acontece é uma espécie de antevisão da rotina que se pretende viver no empreendimento a inaugurar no início do próximo ano. Aficionados do vinho e respectivas famílias a cultivar o gosto pelo produção vinícola. Olha-se em volta e percebe-se a situação insólita: com roupa de marca da cabeça aos pés, três amigos, com chapéus de palha, discutem em que parte do caule se corta o cacho. Mães e avós preocupam-se com o dedo cortado da Martinha. Os risos não parecem comprometer a concentração, mas denunciam o propósito: isto não é trabalho, é lazer.

Para além das moradias individuais, algumas já em construção, o espaço de 66 hectares conta com um hotel, um restaurante e um spa, explorados pelo Grupo Lágrimas. O núcleo central ergue-se em torno de um grande lago artificial e tem como paisagem de fundo o castelo de Montemor-o-Novo. O local pretende ser uma referência no enoturismo em Portugal, um segmento turístico integrado no produto Gastronomia e Vinhos, considerado estratégico pelo Turismo de Portugal - que espera um crescimento exponencial deste mercado nos próximos anos. Em 2006, a procura primária de roteiros de Gastronomia e Vinhos já representava 600 mil viagens na Europa, prevendo as estimativas um crescimento anual na ordem dos 7% a 12 %, levando a que em dez anos o mercado possa mais que duplicar.

Em Portugal, o Plano Estratégico Nacional do Turismo prevê um crescimento de 10% até 2015 nas viagens para o país motivadas pela Gastronomia e Vinhos, sobretudo no Norte, Alentejo e Centro. A região alentejana é, por sua vez, um dos territórios turísticos onde o crescimento é mais visível nos últimos anos. Em 2009 foi um ano recorde e os dados relativamente ao primeiro semestre de 2010, com proveitos totais na ordem dos 5,3 milhões de euros, apontam para que receitas, dormidas e total de turistas não pare de crescer.

Regresso às origens mas com estilo. "As pessoas estão fartas de coisas já feitas, querem lidar directamente com o processo", diz uma das responsáveis pela comunicação do Vineyards, enquanto a colega recolhe as luvas e as tesouras dos que acabam de vindimar a sua fila. "No fundo, é um regresso à experiência directa." O conceito foi exportado de países como a África do Sul ou os Estados Unidos da América - onde os vales da soalheira Califórnia ocupam lugares cimeiros no top do enoturismo mundial.

A experiência oferecida parece encaixar directamente no perfil do enoturista traçado por um estudo do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto em 2007. Situados na faixa etária dos 50/60 anos, os enoturistas são maioritariamente motivados pela "vontade de aprender", possuem um "poder de compra superior à média [mais de 210 euros por dia]","exigem conforto e procuram o ''topo de gama''". No L''AND Vineyards deverão encontrá-lo. As mordomias incluem uma entrada directa no Wine Club, o que significa o acesso a cursos de enologia, concursos de vinho, provas e outros eventos. Todos podem utilizar a adega, com cubas próprias, e podem ter garrafeira no restaurante do resort para servir o seu vinho personalizado. A parceria com o grupo Lágrimas dá-lhes ainda acesso a todo o universo hoteleiro do grupo em condições preferenciais.

O empreendimento conta ainda com o carimbo de eco-resort, exigências de um público com a consciência ecológica desperta. Para isso contribuem os planos de cultura totalmente orgânica e a aposta na eficiência energética que recorre à energia solar para climatização, aquecimento de água e microgeração de energia.

A paisagem é assinada por cinco arquitectos, cada um deles responsável por núcleos de villas cujas linhas pretendem reinterpretar as casas-pátio mediterrânicas de tradição romana e árabe. A CB Richard Ellis está encarregue da comercialização das propriedades. A estratégia aponta para o mercado internacional, mas até agora foram os portugueses quem mostrou maior interesse. Das 145 moradias projectadas (cuja edificação só começa pós-compra), 40% já foram vendidas, e cerca de 90% dos compradores pertencem ao mercado nacional. Quem tiver a chave na mão na altura da inauguração do resort, em Janeiro, pode já fazer parte das próximas vindimas. Quanto à garrafa com o seu nome em cima da mesa, isso só a partir de 2012. Palavra de enólogo.
 
 
English