Novas das Terras do Demo
João Paulo Martins | Revista Única do Expresso | 20-03-2010

Os tempos áureos das terras beirãs produtoras de vinhos apreciados e premiados, esse tempo já lá vai. Toda a zona da Beira Interior está sempre mais ou menos esquecida dos consumidores. Não por culpa dos consumidores, naturalmente, mas antes por um apagamento progressivo face às novas coqueluches de que toda a gente fala, o Douro e o Alentejo.

Curiosamente, a Beira Interior está a sul do Douro, partilha com ele algumas castas - como a Tinta Amarela, o Marufo, o Bastardo ou a Malvasia Fina e faz fronteira com a região do Dão, da qual também 'bebeu' a Tinta Pinheira - conhecida na Beira por Rufete - ou a Borrado das Moscas, a mesma casta branca que na Bairrada se chama Bical e noutras terras Pintada dos Pardais.

Nestas zonas de interior, que se estendem até Castelo Branco, encontramos um clima continental, uma zona de altitude que pode ser esplêndida para a produção de vinhos finos, elegantes, de elevada acidez e também capaz de dar origem a grandes rosés e espumantes. Dito desta maneira, o que a Beira Interior mais parece é a terra prometida, o local idílico que ninguém descobriu.

De facto, não é bem assim, há muito que se conhece o tipo de vinho que ali se pode produzir, mas aqui, como noutras regiões, os produtores estão a ensaiar novas castas, a introduzir as que deram provas noutras terras, como a Touriga Nacional e a Tinta Roriz, e também algumas brancas, como a Chardonnay. É verdade que pouco se fala dela, mas também é certo que os enólogos que vindos de outras regiões aqui chegam para trabalhar ficam espantados com as potencialidades destas terras graníticas para fazer vinhos delicados e cheios de carácter.

Quantas vezes por mês bebemos vinho de Pinhel, de Castelo Rodrigo, ou da Covilhã? De facto, poucas, seguramente menos do que estes vinhos merecem. Não todos, é certo, e as adegas cooperativas locais também não ajudam a melhorar a situação. Há, contudo, novos produtores, como os vinhos da Quinta dos Termos, os vinhos da Quinta das Vermelhas, Quinta dos Currais, por exemplo, mas falta massa crítica, falta mostrar estes vinhos, falta agarrar novos consumidores. Isso tem de ser feito com uma imagem renovada da região, não pode ser à sombra dos prémios que uma cooperativa ganhou nos antigos concursos do IVV (cf. o site da Comissão Vitivinícola - www.cvrbi.pt), numa época em que muitos dos novos consumidores nem nascidos eram.

Como diriam os Black Eyed Peas, "I got a feeling" que nesta região ainda nascerão grandes vinhos, mas está quase tudo por fazer. Espera-se que, contrariando o mau exemplo de outras regiões, não se desperdice todo o património genético das castas locais para as trocar por Syrah e Alicante Bouschet, Touriga Nacional e Viognier. É que dessas já temos, obrigado. É do Rufete, do Cercial, da Síria e da Tinta Amarela que precisamos. É também por aí que nos demarcaremos do resto do mundo.

 
 
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