A Casa do Douro quer pagar com vinho uma dívida que ronda 100 milhões de euros. Intenção anunciada, ontem, pelo presidente da instituição, Manuel António Santos, no final da reunião do Conselho de Viticultores.
O dirigente explicou que "chegou a altura de dizer basta", que a Casa do Douro "quer viver de cara levantada", que se fartou de ser "maltratada, vilipendiada e posta na sarjeta, todos os dias, pelos mais variados responsáveis deste país". Vai daí, apresentou a proposta do pagamento da dívida com vinho aos 58 conselheiros que ontem foram à reunião, na Régua. E colheu simpatia: foi aprovada por unanimidade.
Manuel António Santos alega que "não é justo" que a Casa do Douro apareça diariamente na praça pública com o rótulo de "incumpridora e caloteira". E acusa "aqueles que lhe chamam nomes" - leia-se Governo - de serem os responsáveis de criarem as condições para "tapar todas as fontes de receitas e financiamento".
O dirigente assume que "chegou o momento da verdade". O Estado quer receber e ele até acha "muito bem". Mas não há dinheiro. E sem outra forma de poder liquidar a dívida, à banca e ao Estado, a solução terá de passar por "pagar com vinho". "Os nossos vinhos têm preços tabelados, os negócios que temos feito com eles ultrapassam esses preços, o nosso stock supera claramente a dívida, logo…"
Manuel António dá mesmo um exemplo comum: "Se eu tiver um crédito à habitação e não conseguir pagar a casa o banco fica com ela, não é? No nosso caso temos os vinhos, alguns muito velhos, autênticas jóias e relíquias que qualquer coleccionador gostaria de ter".
Aliás, refere que a venda de vinho em caso de incumprimento "está prevista no contrato" celebrado com o Governo, que deu o seu aval aos últimos empréstimos contraídos pela Casa do Douro, em 1997. "Como não nos sentimos minimamente responsáveis por não poder pagar em dinheiro, pagamos com o que temos", reitera Manuel António Santos que até já pensou na forma de viabilizar a operação: "passar os vinhos para o Instituto do Vinho do Douro e Porto ou para quem o Governo entender".
Mas a proposta não se fica por aqui. A Casa do Douro propõe ao Governo incluir no pagamento das dívidas "a participação que possui na Real Companhia Velha". Foi adquirida há anos por 48 milhões de euros, mas Manuel António Santos não precisou quando pode valer agora. "Vale aquilo que for possível apurar em negociações directas com a Real Companhia ou outro parceiro qualquer", frisou.
Mais: "Em vez de nos andarem a, subrepticiamente, roubar o cadastro das vinhas, estamos disponíveis para o vender". "Queremos tudo às claras", disse. Nas negociações, que Manuel António quer "sérias", admite incluir ainda alguns imóveis espalhados pela região demarcada, como um armazém em Foz-Tua e destilarias em Lamego e Favaios, entre outras localidades. "O Estado deve considerar-se responsáveis por eles, pois obrigou-nos a retirar os excedentes de vinho e a destilá-los para introduzir a aguardente no Vinho do Porto".
Ora, se o Governo aceitar as condições, o dirigente está seguro que a Casa do Douro "deixará de ser caloteira" e passará a assumir competências mais apropriadas como "apoiar e defender os viticultores, e a viver com dignidade". No dia em que a instituição tiver a folha limpa, "será feita uma grande festa no Douro", acrescentou. |