Governo corta margem de manobra à Casa do Douro
Ministério da Agricultura já executou 8,6 milhões de litros de vinho e 85 por cento da posição na Real Companhia Velha, pelo que não podem ser negociados
Oitenta e cinco por cento do valor das acções que a Casa do Douro detém na Real Companhia Velha e 8,6 milhões de litros de vinho do Porto já estão nas mãos do Estado, pelo que não podem voltar a ser negociados, garantiu ao PÚBLICO o Ministério da Agricultura em resposta a questões colocadas sobre a situação financeira da instituição duriense.
O ministério tutelado por Jaime Silva esclarece, ainda, que tal posse decorre da execução dos penhores que pendiam sobre a Casa do Douro (CD), depois de esta não ter pago as dívidas que contraiu (num processo de reestruturação financeira assinado em 1997) e depois de o consórcio bancário ter exigido "ao Estado, como avalista, a recuperação das dívidas totais".
Esta posição do Estado vem retirar margem de manobra a Manuel dos Santos, que dirige a instituição há nove anos, e que ainda não clarificou se pretende apresentar-se a um quarto mandato, nas eleições convocadas para 1 de Fevereiro. O actual presidente sugeriu que as dívidas da CD, que estão contabilizadas em cerca de cem milhões de euros, poderiam ser pagas com os vinhos que esta tem em stock. Foi essa a proposta que fez aprovar num Conselho de Viticultores realizado no início deste mês. Porém, e como clarificou o ministério, esses vinhos já foram executados. "Não há lugar a qualquer negociação, pois os vinhos penhorados serão avaliados sobre o seu valor real actual e as suas condições de venda futuras, uma vez que não poderão ser vendidos de imediato", esclarece o ministério.
Enquanto essa avaliação não for feita, não se saberá, portanto, se a CD ficará com as dívidas que tem para com o Estado saldadas ou se "terá lugar a penhora adicional de bens imóveis, que a Casa do Douro já indicou disponibilidade"; com essa contabilidade feita é que o Governo decidirá, também, que destino dar às acções da Real Companhia Velha. A compra de uma posição de 40 por cento da Real Companhia Velha foi decidida pelo antecessor de Manuel dos Santos, Mesquita Montes, em 1990.
A situação financeira da Casa do Douro tem vindo a degradar-se desde então. Para além das dívidas avalizadas pelos Estado, a Casa do Douro contraiu outros empréstimos, hipotecando inclusive a sua sede, nomeadamente junto do Banco Português de Negócios (BPN), instituição financeira que no Verão passado ameaçou avançar com uma hasta pública sobre o edifício da Régua.
No esclarecimento enviado ao PÚBLICO, o ministério exorta a actual direcção a "disponibilizar a todos os candidatos, e particularmente aos seus sócios", informação sobre a "real situação financeira da instituição", já que só ela permitirá que se apresentem "com propostas exequíveis e com um projecto assente em bases sólidas".
O PÚBLICO tentou ouvir Manuel dos Santos, mas não o conseguiu fazer durante o dia de ontem. O até agora único candidato, Pedro Garcias (jornalista do PÚBLICO que suspendeu actividade para se candidatar), afirmou que a instituição "está de pés e mãos atadas". "Confirmam-se os piores receios. A CD está numa situação caótica e precisa de voltar a viver num clima de confiança. Só acordos de regime entre todos e a criação de um plano de acção de longo prazo, que permita colocar estes vinhos de forma faseada no mercado, a poderão salvar", afirmou.