Produção de vinho em Portugal cai 5,7% este ano devido ao mau tempo e doenças no campo
Problemas na floração e ataques de míldio e oídio fazem recuar a produção vinícola para 5,9 milhões de hectolitros na campanha 2014/2015 cuja vindima está no terreno.
A produção de vinho na campanha 2014/2015, que se inicia com a vindima em curso, deverá recuar 5,7% face à anterior. Num ano amargo para os produtores, com condições climatéricas muito difíceis e ataques frequentes de doenças, há nove regiões vitivinícolas com decréscimos de transformação de uva em vinho, quatro que têm uma melhoria de desempenho e uma que mantém o registo (Alentejo). Dão, pela negativa, e Península de Setúbal, pela positiva, são os destaques do ano vinícola.
As previsões de produção de vinho em Portugal, produto que garante exportações superiores a 700 milhões de euros por ano, foram divulgadas pelo Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), com base nas indicações colhidas no terreno pelos técnicos das várias regiões vitivinícolas, incluindo os Açores e a Madeira. Para a campanha que está a arrancar, o IVV aponta para a produção de 5,9 milhões de hectolitros de vinho, face aos 6,2 milhões que tinham sido registados na campanha anterior.
O volume de vinho que irá ser produzido está cerca de 6% abaixo da média das últimas cinco campanhas e constitui o segundo pior registo para o período – apenas na campanha de 2010/ 2011 é encontrado um voluma de produção abaixo dos 5,8 milhões de hectolitros. Entre 2009 e 2014, o recorde de produção foi atingido na campanha de 2010/1011 com um total de 7,2 milhões de hectolitros a saírem das adegas.
Frederico Falcão, presidente do IVV, confirma que foram mesmo as condições climatéricas que determinaram este mau ano na vinha. “Até seria expectável que a produção aumentasse, porque na última década Portugal reestruturou cerca de um quarto da vinha. As velhas vinhas foram substituídas por novas, com recurso a castas que garantem uma maior produtividade”.
O tempo é que não ajudou. “A Norte, diz o responsável, os problemas começaram logo no período da floração, num estágio ainda primário das culturas”. Tempo frio e chuvoso acabou por provocar desavinho (que acontece quando a flor não se transforma em fruto) e bagoinha (cachos com bagos de dimensões reduzidas, muitas vezes sem grainha). No Centro e Sul, os problemas tiveram mais a ver com ataques de míldio e oídio que, apesar dos tratamentos fitossanitários aplicados, tiveram impactos significativos nos volumes de uva que entretanto tinha vingado.
A região vitivinícola mais afectada pelas más condições climatéricas foi a de Terras do Dão. A previsão de colheita aponta para os 228 mil hectolitros, um valor que representa um recuo de 25% face à campanha anterior. A diferença para a média das últimas cinco campanha é de quase 100 mil hectolitros.
Arlindo Cunha, presidente da comissão vitivinícola local, afirma que os problemas começaram logo no período da floração, mas “o principal problema consistiu nos ataques de míldio e oídio”, fungos que acabam por destruir os cachos de uva. “Apesar de terem sido efectuados tratamentos em vários momentos, o certo é que muitos deles não funcionaram. A previsão é de um recuo de 25% para toda a região, mas há casos de produtores em que as perdas podem chegar aos 45%”, revelou o responsável.
No Dão, com a vindima já adiantada, espera-se agora que menos quantidade signifique mais qualidade. “As uvas têm muita doçura, são muito aromáticas, o que gera expectativas de que a qualidade seja boa nesta campanha em que os produtores enfrentaram custos acrescidos dada a quantidade de tratamentos que tiveram que realizar”, afirmou Arlindo Cunha.
As zonas do Minho e do Douro são outros dois exemplos dos impactos negativos que o clima teve no ano de vinhos. A região onde o verde predomina deverá ter um recuo na produção de 10%, semelhante ao que irá verificar-se no terreno duriense, que, no entanto, manterá a liderança na produção com uma colheita de 1,3 milhões de hectolitos. Na segunda posição manter-se-á o Alentejo, com uma colheita superior a 1,1 milhões de hectolitros, idêntica à da campanha anterior.
No outro lado do quadro vitivinícola 2014/2015 está a Península de Setúbal, que deverá registar 490 mil hectolitros na adega, 20% acima do que tinha sido conseguido na campanha anterior. Ana Oliveira, técnica da comissão vitivinícola local afirma que “o clima foi favorável, com equilíbrio entre frio e calor que potenciou a vindima. Temos mais uma boa colheita em perspectiva, mas desde 1993 que temos vindo a crescer.”
Pelo que tem visto na vindima, que está muito adiantada, Ana Oliveira acredita que a qualidade será este ano elevada. “A maturação das uvas é boa e, por isso, no plano teórico, a qualidade será boa. Mas só depois da adega é que se vê”. A diversidade de solos que caracteriza a região, bem como as influências marítimas na cultura, aliadas a condições climatéricas favoráveis vão permitir à península manter a aposta numa elevada a relação qualidade-preço.
Frederico Falcão diz que ainda é cedo para ter uma ideia sobre a qualidade dos vinhos tintos, cuja vindima está menos adiantada do que a dos brancos. “Já ouvi opiniões dos dois lados. A única certeza é que têm muita cor, este ano”. Quanto aos brancos, não tem dúvidas de que na presente campanha irá imperar a qualidade. “Há muito equilíbrio na acidez, muito aroma, muita fruta. Há zonas onde pode atingir-se a excelência”.
Quanto aos impactos sobre o sector, o gestor do IVV afirma que as gamas altas, com engarrafamento menos extenso, irão sentir menos problemas. “Nas gamas baixas, com os stocks já baixos, os problemas serão mais sentidos. As importações a granel irão, por certo, subir”, afirmou Frederico Falcão.