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Classificação da UNESCO pouco deu ao

Diário de Notícias | 11-12-2009 | Geral, Regiões, Património
Oito anos depois de confirmado o estatuo à Região Vinícola Demarcada mais antiga do mundo, "há muito caminho a percorrer para que o sector tire proveito" do reconhecimento mundial. Há mesmo que considere que há mais "folclore" e "poesia" do que propriamente resultados...
Foi durante a manhã de 14 de Dezembro de 2001 que a UNESCO decidiu atribuir o galardão de "Património Mundial" ao Douro Vinhateiro. O veredicto, de enorme valor e relevante significado, encheu de alegria o país e sobretudo a região, onde foram criadas muitas expectativas socioeconómicas. Passados oito anos, procurámos saber se o sector do vinho, nomeadamente as adegas, os lavradores, produtores e organismos, ou seja, o "Douro do Vinho", já está a colher realmente os dividendos desta distinção. O balanço feito por vários responsáveis é que as mais-valias financeiras da classificação têm sido mais visíveis em alguns sectores. A hotelaria e o turismo dominam, mas existe uma outra área "deficitária" onde essas mesmas mais-valias ainda não são tão evidentes, a viticultura de subsistência.

O presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP), Luciano Vilhena Pereira, foi claro. "O Douro tem que perceber que, relativamente às duas Denominações de Origem de excelência, o vinho do Porto já está consolidado a nível mundial, mas o vinho do Douro tem ainda muita margem para progredir".

"É evidente que o vinho do Douro aliado à paisagem Património Mundial terá mais valor acrescentado, mas podemos chegar mais longe. Não vendemos o vinho sem a paisagem e também não se vende a paisagem sem a vinha. Ainda falta a consciência de que deve haver uma maior interacção entre essas duas dimensões", considerou o mesmo responsável classificando como fundamental a "parceria".

Luciano Vilhena Pereira defendeu também a necessidade de uma maior aposta na formação, sobretudo ao nível da hotelaria e da agricultura durienses, recordando que a região é considerada mesmo como a "menos qualificada" do país. "Apesar de alguns progressos, ainda há um caminho longo a percorrer para melhorar os indicadores", sublinhou.

"O título não deve ser só comercial, deve também reverter em benefício de quem produz"

Já Isabel Marrana, da Associação de Exportadores de Vinho do Porto (AEVP), acredita que houve vantagens com a classificação, mas também reconheceu que ainda há muito a fazer para que o sector tire o devido proveito da atribuição da UNESCO. "O galardão atribuído à Região Demarcada, a mais antiga do Mundo, tem que ser rentabilizado. Os comerciantes de Vinho do Porto já se aproveitam disso mesmo, dizendo que o seu vinho provém de uma região que, para além de ancestral, é património da Humanidade".

Isabel Marrana salientou ainda os investimentos turísticos que estão a ser feitos no Douro como forma "de demonstrar que se pode sentir essa margem de progressão". Todavia, admitiu o "lado B" da questão: "Apesar do Douro ser hoje a paisagem da moda, a ligação entre o destino turístico, o vinho e o enoturismo ainda não está totalmente concluída, ainda existe margem de desenvolvimento. O título de Património Mundial não deve ser só comercial, deverá também reverter em benefício de quem produz, trabalha e comercializa".

O presidente da União das Adegas Cooperativas da Região Demarcada do Douro, José Manuel Santos, assume uma posição muito crítica ao considerar que, apesar do "natural contentamento com a classificação", ao fim de oito anos, "sinceramente, a decisão ainda trouxe muito pouco para quem trabalha na lavoura, neste caso para os viticultores".

Garantindo que ainda não há feedback financeiro, o presidente da União das Adegas acredita que à volta do título há mais "folclore" e "poesia" do que propriamente resultados. "Os inúmeros colóquios, simpósios, seminários, estudos, planos e projectos feitos em prol da promoção do Douro Vinhateiro têm poucos efeitos práticos. E as comissões, as entidades, os grupos e os gabinetes representam um rol burocrático que nunca mais acaba".

A voz crítica de José Manuel Santos focou ainda a paisagem protegida, onde "se notam cada vez mais agressões ambientais. Até parece que não há nenhuma entidade que fiscalize e actue sobre esta problemática. Aliás, corremos o risco de perder a distinção", adverte o dirigente lembrando que "a construção está desenquadrada e os resíduos ainda são bem visíveis". "Não podemos esquecer que a região foi classificada como paisagem viva e evolutiva, por isso há que ter cuidados especiais", frisou.

Depois da alegria da classificação, a "frustração" e o "desencanto".


Por fim, o duriense deixou explícito um sentimento de frustração "relativamente ao sector cooperativo", para o qual a classificação de Património da Humanidade também não trouxe nenhuma vantagem. "O Douro não pode ser uma montra para inglês ver. A classificação da UNESCO tem que trazer mais-valias para quem cá trabalha, principalmente para o sector do vinho e da vinha", reforçou José Manuel Santos.

Na mesma sintonia, está o presidente da Casa do Douro , Manuel António Santos que, apesar de parco em palavras, foi incisivo ao admitir, sem pejo, que ainda não deu "conta de qualquer efeito positivo, visível, na lavoura duriense". "Tudo o que não corresponde à expectativas criadas, é apenas desencanto", lamentou o presidente da Casa do Douro sem, no entanto, questionar "a importância do título, pois ele é merecido".

Apesar destes constrangimentos, todos temos de acreditar que a Paisagem Cultural Evolutiva e Viva do Douro Vinhateiro é, sem dúvida, um património que deve orgulhar todos os durienses. É um raro exemplo em que a intervenção humana na paisagem não a desvalorizou, antes pelo contrário, enobreceu-a, assentando numa tradição cultural antiga, baseada na vitivinicultura, que se mantém e continua dinamicamente activa, sempre capaz de se adaptar ao evoluir dos tempos.

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