Jornalista americano critica rolhas de rosca e defende as de cortiça
O jornalista americano Paul White criticou ontem, em Vila Real, a utilização das rolhas de rosca (screw cap) no engarrafamento dos vinhos, defendendo a tradicional rolha de cortiça para a manutenção da qualidade deste produto.
Paul White foi um dos oradores do "Infowine Fórum", congresso organizado pela Vinideias e que decorre entre ontem e quarta-feira, em Vila Real, contando com a participação de cerca 400 pessoas, onde se destacam alguns especialistas mundiais em Viticultura e Enologia.
O jornalista é americano, editor e crítico de vinhos, reside actualmente na Nova Zelândia, colabora com algumas das mais prestigiadas publicações internacionais e pertence ao júri de prova de concursos mundiais como o "Concours Mondial de Bruxelles" ou o "London's International Wine Challengue".
O tema abordado pelo americano, "o efeito anti-terroir da baixa permeabilidade da 'screw cap' em vinho, suscita grande controvérsia desde há alguns anos, quando a introdução destas rolhas de rosca, na Austrália e Nova Zelândia, entraram em competição com as rolhas de cortiça.
Desde a sua introdução no final dos anos 90, os vinhos engarrafados com 'screw cap' aumentaram em cerca de 90 por cento na produção da Nova Zelândia e 70 por cento na Austrália.
Paul White foi bastante crítico à utilização da rolha de rosca, salientando o impacto dos fenómenos de redução provocados por este vedante no pós-engarrafamento, em condições próximas da anaerobiose (relacionada com a ocorrência de reacções químicas na ausência de oxigénio que desenvolvem aromas estranhos nos vinhos).
Referiu que, naqueles países, para tornar os vinhos seguros para o engarrafamento com rolhas de rosca, colocou-se uma "enorme confiança" no sulfato de cobre como tratamento preventivo antes do engarramento e como tratamento curativo no pós-engarrafamento.
O jornalista salientou ainda que um 'pinot noir', originário da Nova Zelândia e vedado com 'screw cap', foi recentemente rejeitado pela União Europeia por causa de um teor de sulfato de cobre de 2.6 miligramas por litro, "corroborando as suspeitas de que níveis ilegais de resíduos são regra, em vez de excepção".
Na Europa, o máximo permitido é de um miligrama por litro.
Paul White considera que o vedante sintético altera o vinho, não preservando a "sua alma nem as suas características genéticas".
Para o enólogo Mário Andrade, os níveis excessivos de cobre encontrados no vinho neozelandês, estão relacionados com "más práticas enológicas".
O enólogo, que trabalha nas regiões do Ribatejo, Alentejo e Algarve, referiu que uma empresa italiana está a desenvolver um 'screw cap' que permite uma "maior permeabilidade do oxigénio", que poderá inibir os problemas de redução que provocam os odores estranhos nos vinhos.
Mário Andrade diz que a tónica principal a colocar nesta questão é "qual é o melhor vedante que podemos utilizar nos diferentes vinhos".
O especialista está a utilizar nos seus vinhos topo de gama, para envelhecer a muitos anos, rolhas de cortiça natural.
"Não estou satisfeito com nenhum dos estudos até agora em termos de vedantes alternativos, pelo que optei por uma rolha de cortiça natural", salientou à Lusa.
Já para os vinhos tintos, que consomem mais oxigénio, são de gama média e duram cerca de dois a três anos, elegeu as rolhas técnicas, as quais salienta que não levantam problemas de TCA (gosto da rolha) e que permitem uma boa vedação e permeabilidade do oxigénio.
"Em vinhos brancos e rosés, para consumo de um ano ou dois anos e de maneira a conservar a frescura, estou a utilizar 'screw cap'", salientou.
Para utilizar a rolha de rosca, Mário Andrade diz que teve que mudar as "práticas enológicas".
"A principal mudança está a nível dos antioxidantes. Não posso proteger tanto o vinho da oxidação", explicou.
O enólogo aderiu à 'screw cap' há três anos, sendo o vedante utilizado numa empresa ribatejana que já exporta 80 por cento da produção
A enológa Bárbara Sistelo, que conjuntamente com a engenheira agrícola Leonor Santos, organizou o "Infowine Forúm", referiu que lhe custa a imaginar "os vinhos de topo do Douro com uma rolha que não seja de cortiça".
No entanto, se o mercado exigir uma solução alternativa diz que aceita outro tipo de vedantes.
"No futuro, vai haver uma grande mudança tanto a nível de vedantes como da embalagem em si. Eu acho que os novos consumidores são abertos a modas e mudanças, precisam de ser alimentados com novos produtos. Vai acontecer a nível de bebidas e no vinho isso não é excepção", salientou
Bárbara Sistelo considerou "surpreendente" a visão de Paul White sobre esta matéria, já que, segundo frisou, trata-se de alguém que vem directamente do Novo Mundo e que demonstra ser "anti 'screw cap' e pró cortiça".
Quanto ao congresso, a responsável referiu que se tenta fazer, nestes dois dias, "o encontro entre a investigação e as fileiras da produção e da comercialização".
No teatro de Vila Real, foi montada uma zona de 'stands' onde se está a promover uma bolsa de contactos entre as empresas do sector, e onde estão também os representantes em Portugal de vinhos estrangeiros que estão no top de vendas a nível internacional.
O objectivo fundamental da Vinideas, sediada no ninho de empresas de Vila Real, é "divulgar junto dos técnicos e empresas do sector, a investigação que é feita nas universidades".
A Vinideas está ligada ao grupo internacional Vinideanet, que publica uma revista de Viticultura e Enologia, difundida através da Internet (infowine.com), que tem desenvolvido várias acções de informação/formação para o sector.